Atraso no repasse no Minha Casa, Minha Vida no Ceará já rendeu redução no quadro dos funcionários que operavam nas obras da Faixa 1. Cerca de três mil pessoas ao longo de 2019 foram demitidas e a previsão é que mais dez mil sejam desligadas até o fim do ano, caso as construtoras resolvam suspender os projetos por falta de dinheiro.

De acordo com o presidente do Sindicato das Construtoras do Ceará (Sinduscon-CE), André Montenegro, pelo menos 15 empresas irão paralisar as atividades nos próximos dias. Segundo ele, a dívida do Governo Federal com as empresas no Estado está em torno de R$ 35 milhões e soma mais de R$ 180 milhões no Nordeste e R$ 600 milhões no Brasil. Apenas as obras do Faixa 1 são afetadas, as demais são cobertas pelo FGTS.

A Faixa 1 do Minha Casa Minha Vida atende famílias com renda de até R$ 1,8 mil, que financiam o imóvel em até 120 meses, com prestações a partir de R$ 80. 

Entre as obras prejudicadas pelo repasse e com previsão de paralização é o Residencial Alto da Paz, no Vicente Pinzon, com R$ 5 milhões em atraso.

"Essa é a última opção de toda construtora. Além de gerar desemprego, são funcionários antigos, que estão com a gente a muito tempo, mas a gente é obrigado. O que não pode é continuar com o funcionário e não ter como pagar", pontua Clausens Duarte, presidente da CR Duarte Engenharia, responsável pela construção.

Ao lado do Residencial Nossa Senhora do Rosário, em Russas, o valor combinado ultrapassa os R$ 6 milhões. "Em Russas, consegui finalizar a obra. Era para eu ter encerrado no início do ano e, como houve essa série de atrasos, encerrei agora há dois meses. Tivemos que atrasar uma série de pagamentos aos fornecedores. Fomos obrigados a isso, com intuito de não atrasar pagamento de mão de obra. A família toda depende desse emprego, não se pode atrasar o pagamento dessas pessoas", ressalta. 

Além disso, durante todo o processo, tiveram de encarar um ritmo mais desacelerado de obras. Em primeiro lugar, por conta dos fornecedores. Pelo fato de não quitar as dívidas em dia, eles reduziram o crédito nas compras. "Por exemplo, se antes a gente comprava 10 carradas de cimento em um período, agora só pode comprar uma ou duas carradas, então somos obrigados a reduzir o ritmo", acrescenta. 

Para completar, ainda reduziram o quadro de funcionários em 95,8% considerando os dois residenciais. Finalizaram o ano passado com 1200 funcionários e agora contam com somente 50 na folha de pagamento. "E mesmo esses 50, pelo nível de atraso, hoje a gente não tem condição de honrar esses 50. Estamos negociando para ou suspender os contratos ou infelizmente colocá-los todos de aviso", enfatiza.

Esclarecimento
Em nota oficial, o Ministério do Desenvolvimento Regional afirma que dos quase R$ 5,7 bilhões recebidos, até o momento, pelo órgão, R$ 3,35 bilhões foram destinados ao programa, sendo R$ 2,9 bilhões destinados aos empreendimentos da Faixa 1 do Programa. 

"Com objetivo de equilibrar as contas de todas as políticas do MDR, foi adotada a premissa cronológica para a liquidação das faturas, respeitando os períodos de 30, 60 e 90 dias em atraso. Tal metodologia já havia sido alvo de orientação do Tribunal de Contas da União (TCU) para evitar judicialização dos processos - o que poderia acarretar maiores prejuízos à Administração Pública", expõe em nota o Ministério do Desenvolvimento Regional.

No entanto, conforme o presidente do Sinduscon-CE, André Montenegro, o atual pagamento não condiz com o previsto em início de contrato. Mais do que isso, de acordo com Clausens, o qual também é diretor de Obras de Interesse Social do sindicato, não há qualquer previsibilidade no repasse, o qual parou de ser regular desde o fim de fevereiro neste ano.

"Esse programa é um pouco diferente das demais obras públicas. Até o fim de 2018 tinha um pagamento rigorosamente em dia. A gente apresentava a medição para a Caixa Econômica e, em poucos dias, menos de uma semana, faziam o pagamento. Em função dessa metodologia, fazíamos uma programação de qual volume de obra a gente pode pegar. O problema foi a mudança de regra durante o jogo", explica Clausens.

Agora, o último dia que receberam foi em agosto, por volta do dia 25. 

Essa mudança nas regras sem aviso prévio, delongando mais o tempo da construção, segundo Clausens, prejudica principalmente pelo fato de as construções do Faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida não seguirem as proteções previstas em lei das obras públicas tradicionais.
É o caso do reajuste anual do contrato pela inflação e pagamento por desmobilização (para custo de demissão e desmonte de material) e mobilização (para retomar as obras) caso necessário interromper o projeto.

"Essa obra do Faixa 1 não prevê nada disso. É uma obra sem correção alguma. Se demorar muito tempo, a inflação come a margem de lucro, então tem que acabar logo. A gente faz normalmente em menos de doze meses, porque, se passar, a inflação da mão de obra e dos materiais come o lucro. O que está acontecendo é uma mudança de regras no meio do jogo. Contrataram dizendo que iria pagar em dois dias e, no meio, mudou. Na realidade, até hoje não tem essa garantia. Esse é o problema", completa Clausens.

De acordo com André Montenegro, todas as obras do Faixa 1 foram afetadas, em torno de 10 mil unidades que estão em construção, abrangendo 15 construtoras.

"Essas empresas estão sendo prejudicadas no resultado das obras, não vão nem conseguir terminar, porque isso gera custo de admissão, demissão, juros de custo financeiro com atraso de pagamentos, por perda de crédito no mercado. E tem as demissões, a empresa diminui o ritmo porque não tem certeza se vai receber dinheiro e demite. Outro problema é para as pessoas que serão contempladas com as casas, que não vão receber no prazo", elenca André.

NOTA COMPLETA DO MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

A Assessoria de Comunicação Social do Ministério do Desenvolvimento Regional esclarece:

É importante destacar que, como já é de conhecimento público, o País enfrenta restrições orçamentárias que têm impactado a execução de ações e programas da atual gestão do Governo Federal.

Desde o início do ano, o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR) tem feito gestão responsável e transparente das contas e pagamentos dos contratos em andamento da Pasta. Contudo, as obrigações assumidas pelo extinto Ministério das Cidades superam os valores orçamentários e financeiros disponibilizados ao MDR em 2019.

Os contratos em execução das obras do antigo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) – celebrados em gestões anteriores – demandam pagamento mensal de R$ 700 milhões. Desse modo, para atender a integralidade das ações no MDR, em 2019, seriam necessários R$ 8,4 bilhões.

Ocorreu que, conforme estabelecido em fevereiro pelo Decreto n. 9.711/19, foram disponibilizados uma média mensal de R$ 600 milhões. Entre janeiro e setembro, o MDR recebeu R$ 5,4 bilhões. Para o mês de outubro, o documento indicou R$ 289 milhões e, para cada mês subsequente, – novembro e dezembro – está previsto o aporte de R$ 89 milhões.  

Com objetivo de equilibrar as contas de todas as políticas do MDR, foi adotada a premissa cronológica para a liquidação das faturas, respeitando os períodos de 30, 60 e 90 dias em atraso. Tal metodologia já havia sido alvo de orientação do Tribunal de Contas da União (TCU) para evitar judicialização dos processos - o que poderia acarretar maiores prejuízos à Administração Pública.

Dos quase R$ 5,7 bilhões recebidos, até o momento, pelo Ministério do Desenvolvimento Regional, R$ 3,35 bilhões foram destinados ao Programa de Habitação de Interesse Popular - Minha Casa, Minha Vida (MCMV). O valor pago representa 58,7% do total disponibilizado em todas as ações do MDR.

Desse total, R$ 2,9 bilhões foram destinados aos empreendimentos da Faixa 1 do Programa. O valor corresponde a 86,6 % e contempla as famílias que mais precisam. Os demais recursos - R$ 450 milhões - foram utilizados para subvenção econômica dos contratos das Faixas 1,5 e 2.

O pagamento dos recursos só foi possível devido ao empenho de todo o governo, como dos Ministérios do Desenvolvimento Regional e da Economia, ações da Casa Civil da Presidência da República e também do Congresso Nacional. Somente em setembro, o governo do presidente Jair Bolsonaro repassou mais de meio bilhão ao MCMV.

Com o limite financeiro de R$ 289 milhões neste mês de outubro, o MDR destinou R$ 115,6 milhões à Habitação – diferente do que tem sido divulgado por outras fontes. Desse total, R$ 89,5 milhões foram exclusivamente para o MCMV. Os recursos foram distribuídos nas modalidades com pagamentos atrasados há mais tempo.

Ressalta-se que a previsibilidade orçamentária da Pasta e do Programa são de conhecimento público desde 15 de fevereiro deste ano – data da edição do Decreto n. 9.711/19, que estabelece os limites: de movimentação e de empenho (anexo 1); e de pagamento (anexo 4). Além disso, a dificuldade financeira e orçamentária sempre foi informada pelo ministro Gustavo Canuto em reuniões com entidades do setor, assim como ao Congresso Nacional.

O Ministério do Desenvolvimento Regional reafirma seu comprometimento em regularizar a situação e tem trabalhado com o Ministério da Economia e Casa Civil para sanar as pendências financeiras. Paralelamente, a equipe do Governo Federal também tem se dedicado à reformulação do novo Programa Habitacional para que o recurso público seja aplicado de forma eficiente para evitar as falhas identificadas e, principalmente, atenda a população de menor renda do País.

(Fonte: Diário do Nordeste)

Post a Comment