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Mão de obra familiar e manejo sustentável mantêm safras
fartas e produtos de qualidade o ano inteiro. FOTO:
ANTÔNIO RODRIGUES
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A
agricultora Maria Ferreira Gonçalves, a Dona Bia, nunca usou agrotóxicos.
Inicialmente, produzia hortaliças em pequenos canteiros feitos com pneus.
Depois, criou defensivos naturais para o controle de pragas usando mamona, alho
e pimenta. "Tudo que pegava, ela fazia testes", conta o filho, o
também agricultor Ednaldo Ferreira Gonçalves.
Há
quatro anos, Dona Bia faleceu e deixou como legado para os 13 filhos o trabalho
de base agroecológica realizado no Sítio Jurema, em Juazeiro do Norte. A partir
dessa iniciativa, o cultivo foi ampliado a partir da agricultura sintrópica,
sistema agroflorestal adotado no fim de 2017.
O
trabalho na pequena propriedade é tocado por Ednaldo e outras quatro pessoas da
família que moram no entorno. Banana, mamão, cana-de-açúcar, cheiro-verde,
alface, beterraba, cenoura, couve, feijão e milho são colhidos quase o ano
inteiro. Com o novo sistema, outras culturas estão sendo experimentadas como a
amora, que já rendeu alguns frutos, e o açaí, que está em fase de adaptação.
"As primeiras não deram certo", admite o agricultor.
Novas
perspectivas
A
mudança na forma de enxergar a agricultura transformou a vida da família.
"O milho e o feijão, que só dava (sic) no inverno, agora a gente tá tendo
de inverno a verão", ressalta Ednaldo. Com as sombras formadas pelas
bananeiras, mamoeiro, por exemplo, até a maneira de trabalhar mudou. É mais
saudável. A gente trabalha até sem protetor (solar)", conta.
Se
antes, o chão era irrigado três a quatro vezes por dia, agora são duas vezes,
no máximo. "Até o consumo de água diminuiu", comemora o agricultor.
O
acesso a água foi parte importante para implantação deste trabalho. Além de
equipamentos, frutos de políticas públicas, como as duas cisternas, a
propriedade conta com recurso hídrico retirado de um cacimbão. "Com acesso
a água, o apoio da família e a disposição de encarar, o projeto facilitou nosso
trabalho", explica a engenheira agrônoma Raylane Brito, que acompanha a
família.
Os
produtos são comercializados em duas feiras orgânicas de Juazeiro do Norte, uma
que funciona toda quarta-feira, no Cariri Garden Shopping, e outra na Praça
José Geraldo da Cruz, nas sextas-feiras. Cunhado de Ednaldo, o agricultor João
Evangelista é responsável pelas vendas.
"O
pessoal consome mais as hortaliças. Mas teve coisa que a gente plantou a
pedido, como a couve flor. A gente plantou na sombra e tá se desenvolvendo bem,
mesmo fora do inverno", conta otimista. As feiras rendem R$ 600 por
semana. Há, ainda, a venda de cestas de verduras que garantem mais R$ 700 semanais.
A produção de geleia artesanal soma R$ 200 mensais, e os brotos usados para
decorar pratos geram R$ 50 por semana.
Exceção
à regra
Como
quarta economia do Ceará, a terra do Padre Cícero é marcada pela força do
comércio e também da indústria, sobretudo fábricas de calçados, semijoias e
peças de alumínio, que empregam boa parte da população. Com pequena extensão
territorial, a taxa de urbanização de Juazeiro do Norte fica acima de 96%. Por
isso, são poucas as grandes propriedades rurais.
Contrariando
tudo isso, em pouco espaço de terra, o trabalho dos filhos de dona Bia se
tornou referência em sistema agroflorestal no Cariri. A ideia de trabalhar com
este modelo partiu da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento
(Seagri) há dois anos. "Fizemos uma primeira reunião para apresentar a
proposta do cultivo de agrofloresta e o desafio foi aceito. Começamos com um
curso de agricultura sintrópica", explica o titular da Pasta, Romão
França.
Durante
três dias, foi realizado o primeiro curso, responsável por montar a primeira
unidade de cultivo, o talhão, em pouco menos de 7 metros quadrados. Hoje, está
consolidado com uma produção 100% orgânica, em processo de certificação.
"No dia 11 de dezembro, vamos receber a Comissão da Produção Orgânica do
Ceará, com representantes do Ministério da Agricultura. Logo, estará recebendo
o certificado", acredita o secretário.
Mas
não é só no Sítio Jurema que a agricultura é desenvolvida em Juazeiro do Norte.
No Sítio São Gonçalo, 36 famílias produzem boa parte das hortaliças consumidas
na terra do Padre Cícero, incluindo as que abastecem o Programa Nacional de
Alimentação Escolar (Pnae).
Outras
experiências acontecem nas comunidades do Sabiá, Logradouro, Espinho, Carás do
Umari e Carneiros.
"Apesar
de Juazeiro ter um território pequeno, é totalmente agricultável. O solo é bom,
há um regular manancial de água subterrânea", reforça Romão.
Impacto
econômico
Do
Produto Interno Bruto (PIB) de Juazeiro do Norte, apenas 2% vem da agricultura,
enquanto 86% provêm do comércio e serviços e 12% da indústria. Isso não
significa que são poucas as famílias que ainda mantêm a agricultura familiar
como forma de sustento. Segundo o Escritório local da Empresa de Assistência
Técnica Extensão Rural do Ceará (Ematerce), 422 famílias são assistidas,
enquanto outras 1200 são orientadas. A estimativa é de mais de 2 mil
trabalhando na roça.
(Diário do Nordeste)
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