Vários capoeiristas denunciam que mestres do Grupo Cordão de Ouro cometeram abusos contra crianças e adolescentes desde a década de 1970, passando de geração para geração. Os jovens e adolescentes recebiam promessas de viagens para eventos de capoeira, contudo, em troca, tinham que “carimbar o passaporte” — termo usado por eles para a relação sexual com os mestres. O grupo é um dos mais tradicionais e tem atuação em todo o Brasil.
Desde 2020, o Ministério Público do Estado do Ceará (MPCE) investiga lideranças do Cordão de Ouro devido às denúncias de abusos e estupro de vulnerável — como a lei brasileira tipifica a relação sexual com menores de 14 anos. De acordo com o órgão, cerca de dez vítimas fizeram acusações no estado contra vários mestres. Porém, os nomes de todos os envolvidos não foram divulgados para não comprometer as investigações.
Em nota, assinada pelo mestre Suassuna, a Associação de Capoeira Cordão de Ouro repudiou os crimes sexuais que teriam sido cometidos por integrantes do grupo e se colocou à disposição das autoridades para prestar esclarecimentos. O outro mestre não foi localizado, nem os advogados responsáveis pela defesa dele.
“Eles chegaram aqui nos falando da prática, desse abuso, e que isso teria acontecido há muito tempo, e que muitos tinham silenciado, mas que agora estavam em um novo momento, sabem que essas práticas permanecem e que a única forma de coibir isso seria realmente falando”, revela Joseana França, promotora do Ministério Público do Ceará.
Conforme os relatos, o fundador do grupo, Reinaldo Ramos Suassuna, conhecido como mestre Suassuna, estaria entre os suspeitos do crime. Outra liderança, Marcos Antônio Lopes de Souza, o “Espirro Mirim” também teria praticado estupro contra algumas das vítimas.
Conforme a denúncia, os membros do Cordão de Ouro teriam se aproveitado da vulnerabilidade dos alunos para praticar violências sexuais no Ceará e em outros estados. A maioria das vítimas era do sexo masculino e tinha entre 11 a 18 anos.
“Eles poderiam ir para outras capitais, outras cidades, para poder fazer intercâmbio, fazer cursos, e era no meio dessas situações, para conseguir participar, que ocorriam os abusos”, reforça a promotora do MPCE.
‘Sentia muito nojo’
Após 24 anos do crime, uma das vítimas — que não vai ser identificada — resolveu quebrar o silêncio. Ele carrega marcas de uma situação traumática vivenciada quando era criança, com sentimentos iniciais de revolta e dor, que agora, mudaram pelo desejo por justiça.
“Eu sentia muito nojo. Eu cheguei em casa, tomava banho, quanto mais eu me esfregava, mais nojo eu sentia”.
Uma das vítimas de violência sexual praticado por mestres de capoeira do Ceará revela o trauma que passou após os episódios de abuso que aconteciam entre participantes do grupo Cordão de Ouro.
“Eu procurei meu professor na época, que era o Xingu [também do Cordão de Ouro], contei relatei todo o fato, e ele apenas disse ‘ah, o mestre é doido’, e começou a rir da minha cara. Então, a pessoa que era meu mentor na capoeira não me apoiou, eu ia achar apoio em quem? Por isso, esse tempo todo em silêncio”, complementa a vítima.
Fonte: G1 CE
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