Transformada em museu, casa de Telma Saraiva fica no Centro do Crato, na Tristão Gonçalves, a popular Rua da Vala, em referência ao riacho canalizado que corre sob o calçamento. Foto: PH Rodrigues |
20/08/2023
Era começo da década de 1970. Luiz Gonzaga veio ao Crato, no Ceará, para ser fotografado. Ilustraria um álbum, mas o Rei do Baião nunca voltou para buscar.
"Eu lembro das pessoas na porta comentando: 'Luiz Gonzaga está na casa de Telma'. Esse retrato nunca foi divulgado. E está sendo agora por causa desse museu", afirma Ernesto Rocha, curador e filho da fotógrafa Telma Saraiva.
As quatro poses de Gonzagão fazem parte do acervo que celebra a memória da artista do Cariri. Filha de fotógrafos e casada com um, Telma dedicou-se ao ofício e também foi responsável por modernizá-lo.
Ela é considerada uma pioneira na técnica da fotopintura. Usava tinta para colorir e corrigir fotos em preto e branco. Além disso, montava cenários, figurinos, oferecendo um serviço fotográfico com inovações.
Até os que se consideravam desprovidos de fotogenia arriscavam-se perante as lentes de Telma. A vergonha era superada pela certeza de um resultado que seria assinado com capricho, técnica e tintas.
A fotógrafa, que morreu em 2015, aos 86 anos, também gostava de ser fotografada. Faz parte do museu uma sequência de autorretratos que já compuseram uma exposição para além dos limites do Cariri.
Nas cenas, Telma Saraiva surge em poses inspiradas em estrelas do cinema dos EUA como Ava Gardner e Marilyn Monroe.
"Ela era muito vaidosa e, modéstia à parte, bonita. Também gostava de ser fotografada. Então, o clique foi meu. Agora, a pose quem escolheu foi ela. A iluminação era dela. Eu tive o mínimo de participação: apertar o botão da máquina para fazer a foto", conta Ricardo Saraiva da Rocha, o primogênito de Telma.
MUSEU PRESERVA OUTRA RARIDADE
Além das fotos que Gonzagão nunca buscou e dos autorretratos da fotógrafa, o acervo tem câmeras e equipamentos de estúdio antigos, registros da família e um retrato que traduz algo tão caro para os profissionais da imagem, mas que nem sempre é respeitado: a autoria.
Num canto do museu, é possível apreciar a pose de Virgulino Ferreira da Silva em Juazeiro do Norte em 1926, quando visitou o Padre Cícero. Lampião aparece jovem, com lenço ao pescoço, sob um chapéu de abas. Esse retrato ficou famoso no país, mas nem sempre foi atribuído ao seu autor, Pedro Maia.
Pedro Maia, já idoso, em foto feita por Telma Saraiva, na companhia de um amigo da família. Foto: PH Rodrigues |
O curador do museu afirma que a família Saraiva foi responsável por fazer cópias e distribuí-lo. E mantém no acervo a máquina usada pelo fotógrafo e uma foto dele próprio, tirada por Telma. Além disso, a família tem o negativo, mas não o expõe no acervo.
Pedro Maia desistiu da fotografia. Virou taxista. Mas o acervo do museu presta essa homenagem. Afinal, na década de 1920, ele percorreu os então longínquos 10 quilômetros entre o Crato e Juazeiro do Norte para apontar a sua lente em direção ao rosto do homem mais temido do Nordeste.
A bravura e o profissionalismo de Maia são um brinde a todos os profissionais que contam histórias sem sequer usar palavras. Feliz Dia da Fotografia!
Serviço
O Museu da Fotografia do Cariri fica na rua Tristão Gonçalves, 519, centro do Crato. A visita precisa ser agendada com os filhos por meio da conta no Instagram @casadetelmasaraiva e pode levar seu celular, que é permitido fotografar o acervo.
Fonte: Diário do Nordeste
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